O Livro e Eu
Por favor,
não arrumem
os meus livros.
É assim mesmo
que gosto deles
Espalhados pela casa
Tem dia
que me provocam
Não posso sentar
quieta na varanda
sem que Adélia
Lucinda
ou Clarice
fiquem puxando assunto!
Tem dia
que me consolam
Veríssimo
espera comigo
ferver a água do café
E Drummond
me vela o sono
Por favor
não desmarquem
os meus livros!
É assim mesmo
que gosto deles
Com dobrinhas nas páginas
Não se escandalize
Não, não são dobrinhas apenas...
São declarações de amor
Se eu fosse um livro
ia querer dobrinhas!
E anotações!
São como rugas
Sinal de que viveram
Sinal de que alguém
algum dia
se apaixonou por ele
chorou com ele
riu com ele
Então
que fiquemos assim
meu livro e eu
espalhados pela casa
e fazendo questão
de cada uma
de nossas rugas!
Novembro de 2010
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- ▼ 2010 (163)
terça-feira, 30 de novembro de 2010
terça-feira, 23 de novembro de 2010
E essa história me veio inteira na memória...
Quando eu tinha 12 anos, indo para a escola, um menino de rua cruzou comigo e me deu um olhar de raiva e um tapa. O tapa doeu. O olhar doeu. Nunca ninguém havia me odiado antes.
Minha mãe me contou que a raiva do menino não era de mim. Era de todo mundo. E que o tapa não era em mim. Era na vida. Eu não entendi bem o que eu tinha com isso, já que não me batizaram “Vida” e eu nunca havia machucado ninguém. Minha mãe me disse que um dia eu entenderia o menino e aceitaria os motivos dele.
Eu cresci. Entendi o menino. Os motivos...? Entender não é aceitar.
Novembro de 2010
O nome dela é Ana Júlia
Confesso que o que me chamou a atenção nela foi o laço no cabelo. Um laço pequeno, cor de rosa choque, enfeitando o cabelo curtinho e penteado. Olhos risonhos no rosto sério, como se estar triste fosse tarefa árdua e recomendada.
“Tia, me dá um dinheiro prá eu comprar leite pro meu irmão?”
O bebê no colo da menina dormia serenamente, alheio ao tumulto em frente à galeteria onde eu esperava a minha vez de comprar frango para o almoço de domingo.
Pousei os olhos na menina . Não tinha mais de 12 anos. Pensei se o bebê era filho ou irmão. Reparei na roupa limpa e arrumadinha. E no laço cor de rosa.
Perguntei num sussurro, como quem se aproxima de passarinho que pousa perto de manhazinha: “Ele é seu irmão, menina?”
A menina assentiu com a cabeça.
“Cadê a sua mãe?”
O dedo indica a esquina. “Tá ali com os meus irmãos.”
“Vocês são quantos?”
“Oito.”
“Você é a mais velha?”
“Não. Tem dois grandões.”
“Olha, dinheiro eu não te dou, não. Mas, se você quiser, eu te compro um frango. Você quer?”
O sorriso se abriu deixando, enfim, o rosto combinar com os olhos.
“Quero! Aí eu arrumo um guaraná e já dá prá gente almoçar.”
“Então, espera que eu compro o frango prá você.”
A menina esperou do meu lado, brincando com o bebê, agora acordado, como se fosse uma boneca. Conversava com ele alguma coisa que só os dois escutavam. E pareciam se entender bem.
“Olha só como ele entende, Tia.... Ju.. Ju...”
O neném arregalava os olhos quando ela o chamava pelo nome.
“Qual o seu nome, menina?”
“Ana Júlia.”
“Bonito nome.”
“Obrigada!”
Achei a menina educadinha.
“Você tá na escola, Ana Júlia?”
Negou com a cabeça... “Eu não tenho registro.”
Chegou a minha vez. Pedi os frangos. O meu e o da Ana Júlia. Comprei os refrigerantes. O meu diet, o dela normal. Pedi para embrulhar separado e entreguei o dela.
“Escuta, Ana Júlia, deixa eu te dizer uma coisa. Na escola você não tem só estudo, você tem merenda. Eles te dão almoço e lanche. Se um dia você passar em frente a uma escola, entra e procura a diretora. Conta para ela que você quer estudar e não tem registro. Ela vai te ajudar, tá? Toma. Este é seu”. Entreguei o almoço a ela.
“Obrigada, Tia.”
O “obrigada” era pelo frango. Eu queria que fosse pelo conselho. Queria que fosse porque eu olhei para ela como “Ana Júlia”, não como um número. Mas era pelo frango. Não tinha como ser por outra coisa além do frango. Que menino ou menina, de qualquer lugar, pensa em estudar ou em conversar quando está com fome?
Pensei na estatística oficial: mais de 95% das crianças brasileiras nas escolas. Está bem! 95% das crianças registradas. Como saber das milhares que transitam pelas ruas e simplesmente não têm registro. Estão fora das estatísticas.
O nome dela é Ana Júlia. E ela não é um número.
Novembro de 2010
domingo, 21 de novembro de 2010
Espanto
Fazer varanda.
Soltar olho no azul.
Desenhar dia.
Assistir passarinho.
Te parece sem sentido?
A mim, faz todo.
Amigos de ocasião.
Abraços protocolares.
Não ver menino em sinal.
Chorar em novela das oito.
Te parece normal?
A mim, não.
Escolher sorvete pela cor.
Sentir verso me olhando.
Jogar conversa dentro.
Soltar pensamento.
Te parecem metáforas?
Para mim, fato.
Bala perdida.
Homofobia.
Morto de fome.
Menino de rua.
Sem teto.
Te parece normal?
Em mim, dói.
Soltar olho no azul.
Desenhar dia.
Assistir passarinho.
Te parece sem sentido?
A mim, faz todo.
Amigos de ocasião.
Abraços protocolares.
Não ver menino em sinal.
Chorar em novela das oito.
Te parece normal?
A mim, não.
Escolher sorvete pela cor.
Sentir verso me olhando.
Jogar conversa dentro.
Soltar pensamento.
Te parecem metáforas?
Para mim, fato.
Bala perdida.
Homofobia.
Morto de fome.
Menino de rua.
Sem teto.
Te parece normal?
Em mim, dói.
E acha mesmo
que o teu olhar horrorizado,
em frente à tela,
convence?
Que
me vale o horror ao fato,que o teu olhar horrorizado,
em frente à tela,
convence?
se não gera ato.
Então, não me olha em espanto
só porque danço de olhos fechados.
Meus olhos poetas,
há muito,
me abriram o peito
e me descruzaram os braços.
Experimenta você
desfranzir sobrancelhas.
Só para começar!
(Flávia Côrtes – Novembro de 2010)
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Textos devidamente registrados na Biblioteca Nacional e protegidos
quanto aos seus direitos autorais.
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sábado, 20 de novembro de 2010
E agora?
Eu tentei viver com você
no agora.
Fixei olhos no efêmero
e deixei
o amanhã desfocar.
E foi
tanta cor,
tanto riso,
tanta arte,
tanto querer...
que o que era bom me fez bem.
Não fui eu quem levantou o meu olhar.
Foi você
quem segurou o meu rosto
em holofote
para o amanhã
e me disse:
"Olha!"
E agora...?
Flávia Côrtes - Novembro de 2010
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quarta-feira, 17 de novembro de 2010
Apaixonada
E a moça
que gosta de palavras
só sabe
que lia um Drummond,
nesta manhã,
quando se apaixonou
completamente
Apaixonada.
Completamente apaixonada.
Intensamente apaixonada.
Eternamente apaixonada.
A moça que gosta de palavras
se pergunta:
Completamente apaixonada.
Intensamente apaixonada.
Eternamente apaixonada.
A moça que gosta de palavras
se pergunta:
Por que será que
paixão
combina tanto
com tal terminação?
Céticos levantarão sobrancelhas:
Mente?
Poetas entenderão.
Apaixonada,
completa a mente,
intensa a mente,
eterna a mente.
combina tanto
com tal terminação?
Céticos levantarão sobrancelhas:
Mente?
Poetas entenderão.
Apaixonada,
completa a mente,
intensa a mente,
eterna a mente.
só sabe
que lia um Drummond,
nesta manhã,
quando se apaixonou
completamente
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segunda-feira, 15 de novembro de 2010
De olhos abertos
Quando me deixei ir para você,
me prometi tomar cuidado
e mergulhar de olhos abertos.
Foi de olhos abertos que eu te aprendi.
Primeiro eu vi um homem que me olha em muitos olhares.
Olhos que me riem e se riem.
Olhos que me olham poeta e me sabem mulher.
Olhos que me contam quando insiste em não me dizer.
Depois eu vi um homem que planeja o seu sonho.
Um homem que transforma a vida em arte
e faz da arte oportunidade.
E eu te aprendi
entre poemas e músicas,
entre cafés e silêncios,
entre cigarros introspectivos - ou não.
E te aprendendo eu vi
que só me responde quando eu não te pergunto,
que o tato é o que menos te seduz,
que cria como quem respira
e que só café te acorda.
E foi assim que eu te gostei.
Gosto da tua sede.
Uma sede que não alucina,
impulsiona.
Gosto da tua gana.
Uma gana que não desarvora,
objetiva.
Gosto dos teus silêncios.
Porque eu também tenho os meus.
Gosto do teu cheiro.
Um cheiro que é de homem
e que também é de abraço.
Pois é.
Foi de olhos abertos que eu mergulhei.
E eu que me prometi
cuidado.
Flávia Côrtes - Novembro de 2010)
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domingo, 14 de novembro de 2010
O domingo que nós não fomos
Eu não te convidei a desenhar domingo.
Meio porque sabia que não viria
Meio porque te queria,
dessa vez,
senhor do lápis.
Ah, amor, será que você não vê
que tenho olhos poetas?
Nasci com olho que olha prá dentro.
Então, te digo um poema
te beijo
e te deixo
Então, me visto um poema
me beijo
e me deixo
E me vou
em cores
Em mágico domingo,
levo eu o lápis.
Novembro de 2010
Eu não te convidei a desenhar domingo.
Meio porque sabia que não viria
Meio porque te queria,
dessa vez,
senhor do lápis.
Ah, amor, será que você não vê
que tenho olhos poetas?
Nasci com olho que olha prá dentro.
Então, te digo um poema
te beijo
e te deixo
Então, me visto um poema
me beijo
e me deixo
E me vou
em cores
Em mágico domingo,
levo eu o lápis.
Novembro de 2010
quinta-feira, 11 de novembro de 2010
Poema para um Poema Raso
Hoje
meu verso olhou para mim
Era belo o verso
Estampou-se
em meus olhos poetas
mudo
lindo
e nu
Poeta aplicada,
ofereci-lhe agrados.
Sedutora em minhas melhores metáforas,
divertida em minhas metonímias,
cortejei o meu verso.
implicante e belo verso
sem querer vestir palavra
Exagerada,
ameacei deixá-lo
com agressivas hipérboles.
Redundei-me em apelos,
esgotei-me em pleonasmos!
teimoso e belo verso
sem querer vestir palavra
Estava a ponto de deixá-lo,
quando me mostrou,
no fundo da retina...
uma imagem linda
de uma poça d'água
refletindo um rosto
enquanto a luz do sol
transpassava
translúcida
água
Tola e vaidosa poeta!
Novembro de 2010
quarta-feira, 3 de novembro de 2010
Borboletas Idas
Magia dissipada,
vontade se esvai.
E se temos riso,
e se temos arte,
e se temos carinho,
a ti chamaria
amigo.
Será que temos?
(Flávia Côrtes - Outubro de 2010)
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