Meia vida em quatro atos - QUARTO ATO – A era de Aquário
Por esta, vocês vão ter que esperar.
É preciso viver, é preciso aprender, é preciso acordar.
A festa ainda vai começar...
Conjunto de Contos e textos (2009)
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quarta-feira, 10 de junho de 2009
Meia vida em quatro atos - TERCEIRO ATO – Senhoras e Senhores, respeitável público, com vocês, a mulher
Texto 01 – Abram as cortinas
Ela não entrou na juventude, estreou. Subiu no palco, diretora de si mesma. Em um só ato, protagonizou paixão, maquiou dor, iluminou versos. Coreografou as próprias vitórias. Orquestrou as próprias conquistas. Dirigiu seus desatinos.
Na coxia, ri a menina
Da pretensão da mulher
E aplaude.
Texto 02 – Verdes anos
Sem pedir licença, veio a luta.
Moça, nem percebeu.
Diana, afagou os leões.
E não houve pipoca no jantar, luz cortada ou ordem de despejo que tirasse o riso ou interrompesse o verso.
Sabia: no final tudo dá certo. Se não deu certo ainda, é porque ainda não acabou.
Texto 03 – O trabalho e o sonho
Trabalhar mesmo, começou cedo, ou não pagava conta.
No início, por dinheiro. Depois, por desafio. Um dia, para não perder-se. Por fim, por encontrar-se. Enfim, por sonho.
Texto 04 – Que idade você tem?
Já me disseram muitas vezes que eu não aparento a idade que tenho. Normalmente, respondo só com um sorriso.
Mas, às vezes, o interlocutor insiste e o jeito é dar crédito à genética, que me deu uma pele boa, ao riso que me acompanha ou ao pouco sol que tomei nessa vida.
É a face mais fácil da resposta e eu a uso sem pudor, por preguiça de explicar. A verdade inteira fica guardada com as mesmas convicções que me fazem não desistir de escolher sorvetes pela cor, de gostar de ler poesia em voz alta e só escrever quando as palavras começam a rodar em volta de mim.
Tem dia que acordo neném e nem ligo... me enrolo em feto e deixo a manhã me ninar. Tem hora que me permito velha e vejo cética.... Aí, antes que doa, rodo o olho no azul e deixo a luz entrar pela retina, direto, até a alma. Suspiro e solto a menina. Criança, sorrio confiante e crio. Em um minuto, mulher, resolvo, faço, organizo, desorganizo, desfaço, sinto... Dispersa, intercalo a menina com a mulher, sem precisar, sem querer, sem poder... sem saber ou simplesmente por ser.
Eu é que tenho a idade, não é a idade que me tem.
Texto 01 – Abram as cortinas
Ela não entrou na juventude, estreou. Subiu no palco, diretora de si mesma. Em um só ato, protagonizou paixão, maquiou dor, iluminou versos. Coreografou as próprias vitórias. Orquestrou as próprias conquistas. Dirigiu seus desatinos.
Na coxia, ri a menina
Da pretensão da mulher
E aplaude.
Texto 02 – Verdes anos
Sem pedir licença, veio a luta.
Moça, nem percebeu.
Diana, afagou os leões.
E não houve pipoca no jantar, luz cortada ou ordem de despejo que tirasse o riso ou interrompesse o verso.
Sabia: no final tudo dá certo. Se não deu certo ainda, é porque ainda não acabou.
Texto 03 – O trabalho e o sonho
Trabalhar mesmo, começou cedo, ou não pagava conta.
No início, por dinheiro. Depois, por desafio. Um dia, para não perder-se. Por fim, por encontrar-se. Enfim, por sonho.
Texto 04 – Que idade você tem?
Já me disseram muitas vezes que eu não aparento a idade que tenho. Normalmente, respondo só com um sorriso.
Mas, às vezes, o interlocutor insiste e o jeito é dar crédito à genética, que me deu uma pele boa, ao riso que me acompanha ou ao pouco sol que tomei nessa vida.
É a face mais fácil da resposta e eu a uso sem pudor, por preguiça de explicar. A verdade inteira fica guardada com as mesmas convicções que me fazem não desistir de escolher sorvetes pela cor, de gostar de ler poesia em voz alta e só escrever quando as palavras começam a rodar em volta de mim.
Tem dia que acordo neném e nem ligo... me enrolo em feto e deixo a manhã me ninar. Tem hora que me permito velha e vejo cética.... Aí, antes que doa, rodo o olho no azul e deixo a luz entrar pela retina, direto, até a alma. Suspiro e solto a menina. Criança, sorrio confiante e crio. Em um minuto, mulher, resolvo, faço, organizo, desorganizo, desfaço, sinto... Dispersa, intercalo a menina com a mulher, sem precisar, sem querer, sem poder... sem saber ou simplesmente por ser.
Eu é que tenho a idade, não é a idade que me tem.
Conjunto de Contos e textos (2009)
Meia vida em quatro atos - SEGUNDO ATO - da era do chumbo à era do bronze
A adolescência encontrou a menina soterrada em si mesma.
Do lado de fora, a vida seguia com vagar, como devem seguir estes anos. Uma sucessão de dias leves e descompromissados, uma seqüencia de ”escola, cinema, inglês, clube, televisão...”
Do lado de dentro, de volta à terra, como quem volta ao útero. Despojou-se de qualquer outro elemento, em tentativa inútil de retroceder no tempo. Como se isso fosse suficiente para desfazer o mal, reverter a mágoa, desfazer o que não era nominável.
Só não perdeu-se de si por teimosia.
Segurou as lágrimas até desaprender a chorar. Encarou o espelho até não se importar com o olhar. Forçou o sorriso até ter vontade de sorrir. E negou o que doía, até que ela mesma não sabia mais da dor. E entendeu que isso era bom.
Seqüelas? Praticamente nenhuma. Uma ferida fechada, normalmente indolor. Em alguns dias, levemente sensível. Em raríssimas ocasiões, um leve latejar.
Por fim, foi salva da asfixia pela palavra. Pela palavra digeriu a si mesma. E também por ela conectou-se ao mundo novamente. Ao seu mundo e àquele que passou a se descortinar em frente aos seus olhos.
E a vida voltou ao seu curso. Novamente intensa, mais uma vez divertida, de novo encantada... pela sua própria vontade. Mas ainda assim encantada. E ela entendeu que isso era bom.
E assim foi até os loucos anos, que chegaram para ela um pouquinho antes dos vinte. Mas isso já é outra estória.
A adolescência encontrou a menina soterrada em si mesma.
Do lado de fora, a vida seguia com vagar, como devem seguir estes anos. Uma sucessão de dias leves e descompromissados, uma seqüencia de ”escola, cinema, inglês, clube, televisão...”
Do lado de dentro, de volta à terra, como quem volta ao útero. Despojou-se de qualquer outro elemento, em tentativa inútil de retroceder no tempo. Como se isso fosse suficiente para desfazer o mal, reverter a mágoa, desfazer o que não era nominável.
Só não perdeu-se de si por teimosia.
Segurou as lágrimas até desaprender a chorar. Encarou o espelho até não se importar com o olhar. Forçou o sorriso até ter vontade de sorrir. E negou o que doía, até que ela mesma não sabia mais da dor. E entendeu que isso era bom.
Seqüelas? Praticamente nenhuma. Uma ferida fechada, normalmente indolor. Em alguns dias, levemente sensível. Em raríssimas ocasiões, um leve latejar.
Por fim, foi salva da asfixia pela palavra. Pela palavra digeriu a si mesma. E também por ela conectou-se ao mundo novamente. Ao seu mundo e àquele que passou a se descortinar em frente aos seus olhos.
E a vida voltou ao seu curso. Novamente intensa, mais uma vez divertida, de novo encantada... pela sua própria vontade. Mas ainda assim encantada. E ela entendeu que isso era bom.
E assim foi até os loucos anos, que chegaram para ela um pouquinho antes dos vinte. Mas isso já é outra estória.
Conjunto de Contos e textos (2009)
Meia vida em quatro atos - PRIMEIRO ATO - Ninguém é uma ilha.
(Auto- retrato da infância. E primeiro texto escrito sem destinatário)
Não se sabe se Deus foi carinhoso ou sacana quando plantou aquela menina da primeira semana de setembro naquela família. Um pedacinho de terra em meio a ar, fogo e água.
A menina cresceu agarrada à própria terra, para não se perder... encantada demais com o que via a sua volta.
Era impossível não encantar-se com a intensidade do pai, protetor eterno da família, sedutor e vibrante em seu próprio brilho, espalhando força e calor pelos cantos da casa. Bravo às vezes, carinhoso sempre... para ela raramente um rugido.
Assim como foi inevitável deixar-se levar pelas palavras quase ininterruptas da mãe, também mulher, como ela, mas com dupla face e humor, alma gêmea bivitelina de si mesma. Conselheira constante, com opiniões as mais inusitadas, soprou na própria filha mais que vida. Soprou sonho, soprou compaixão. E mostrou, desde cedo, à teimosa filha da terra, a beleza de se permitir mudar de idéia.
Os irmãos, um do ar e outro da água, rodearam a pequena ilha, soprando carinho, ondulando em volta dela proteção.
Passou a infância correndo e brincando com eles.
Juntos caíram, juntos se levantaram, juntos riram e choraram, brigaram e fizeram as pazes em dois minutos, centenas de vezes, como cabe a irmãos. Se protegeram de outros, zangados, preferindo levar a porrada eles mesmos... porque só irmãos podem se bater. E se empurraram, uns aos outros, rindo, em direção a outros, sabendo o quanto seria bom. E deitaram-se de mãos dadas no escuro... e contaram os sonhos assim que acordaram... e falaram uns aos outros de seus medos, seus pudores, seus anseios... falaram dos dias ruins quando aconteceram, falaram das vitórias nos dias em que as viveram, contaram seus desejos pouco antes de decidir se iriam mesmo se entregar a estes... e, logo depois, quer em jubilo, quer em arrependimento... deliciaram-se em saber-se entendidos pelo olhar, sem precisar explicar-se... e também explicaram-se uns aos outros, sem necessidade, só pelo gosto de ser ouvido por quem te aceita, mesmo que não te entenda.
E, de alguma forma, a menina deu terra aos dois... como de alguma forma, seu irmão deu a ela ar e sua irmã a irrigou de forma abundante.
Havia também um terceiro, que mesmo não tendo vindo da mesma fresta, compartilhava com eles a irmandade. Este levantou seu último vôo, levado de volta ao ar cedo demais, mas não sem antes soprar-se para dentro da menina que, hoje mulher, só precisa levantar o rosto no vento para lembrar-se dele.
E assim correu a infância, sem qualquer responsabilidade. Nem mesmo as notas na escola, que isso sempre veio também fácil.
Anos mágicos, vagarosos, luminosos... uma década necessária para dar chão ao que veio em seguida... mas isso já é outra estória.Conjunto de Contos e textos (2009)
(Auto- retrato da infância. E primeiro texto escrito sem destinatário)
Não se sabe se Deus foi carinhoso ou sacana quando plantou aquela menina da primeira semana de setembro naquela família. Um pedacinho de terra em meio a ar, fogo e água.
A menina cresceu agarrada à própria terra, para não se perder... encantada demais com o que via a sua volta.
Era impossível não encantar-se com a intensidade do pai, protetor eterno da família, sedutor e vibrante em seu próprio brilho, espalhando força e calor pelos cantos da casa. Bravo às vezes, carinhoso sempre... para ela raramente um rugido.
Assim como foi inevitável deixar-se levar pelas palavras quase ininterruptas da mãe, também mulher, como ela, mas com dupla face e humor, alma gêmea bivitelina de si mesma. Conselheira constante, com opiniões as mais inusitadas, soprou na própria filha mais que vida. Soprou sonho, soprou compaixão. E mostrou, desde cedo, à teimosa filha da terra, a beleza de se permitir mudar de idéia.
Os irmãos, um do ar e outro da água, rodearam a pequena ilha, soprando carinho, ondulando em volta dela proteção.
Passou a infância correndo e brincando com eles.
Juntos caíram, juntos se levantaram, juntos riram e choraram, brigaram e fizeram as pazes em dois minutos, centenas de vezes, como cabe a irmãos. Se protegeram de outros, zangados, preferindo levar a porrada eles mesmos... porque só irmãos podem se bater. E se empurraram, uns aos outros, rindo, em direção a outros, sabendo o quanto seria bom. E deitaram-se de mãos dadas no escuro... e contaram os sonhos assim que acordaram... e falaram uns aos outros de seus medos, seus pudores, seus anseios... falaram dos dias ruins quando aconteceram, falaram das vitórias nos dias em que as viveram, contaram seus desejos pouco antes de decidir se iriam mesmo se entregar a estes... e, logo depois, quer em jubilo, quer em arrependimento... deliciaram-se em saber-se entendidos pelo olhar, sem precisar explicar-se... e também explicaram-se uns aos outros, sem necessidade, só pelo gosto de ser ouvido por quem te aceita, mesmo que não te entenda.
E, de alguma forma, a menina deu terra aos dois... como de alguma forma, seu irmão deu a ela ar e sua irmã a irrigou de forma abundante.
Havia também um terceiro, que mesmo não tendo vindo da mesma fresta, compartilhava com eles a irmandade. Este levantou seu último vôo, levado de volta ao ar cedo demais, mas não sem antes soprar-se para dentro da menina que, hoje mulher, só precisa levantar o rosto no vento para lembrar-se dele.
E assim correu a infância, sem qualquer responsabilidade. Nem mesmo as notas na escola, que isso sempre veio também fácil.
Anos mágicos, vagarosos, luminosos... uma década necessária para dar chão ao que veio em seguida... mas isso já é outra estória.
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