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domingo, 7 de junho de 2009

Nomes também são palavras.

Não acho ridículo o apelido. Eu gosto de apelidos, quando usados por parentes. Ou então quando opção da pessoa - solução mágica para mudar a sina de um nome! Minhas avós fizeram isso.

Naquela época de nomes graves e sérios, num passe de mágica Geraldina virou a musical e charmosa Didina e Yolanda se suavizou em Landa. Muitas vezes eu as vi se apresentarem a amigos meus e de meus irmãos, usando os nomes que escolheram. "Essa é a minha avó. Vovó, este é Fulano"... e o sorriso se abria e vinha a resposta: "Prazer, Didina", "Prazer, Landa". E, se alguém insistia, corrigiam o pobre coitado. "Prefiro que me chame de Didina", ouvi inúmeras vezes minha avó dizer.

Não vou te contar hoje sobre as minhas avós. São referências importantes para mim, mas um dia você me pergunta delas pessoalmente, se lembrar disso. Eu gosto de contar estas histórias olhando os olhos da pessoa enquanto falo. E, para entender direito como eram, acho que a pessoa precisa ver os meus olhos quando falo delas... porque quando faço isso é como se as visse novamente, tão igualmente lindas e tão completamente diferentes.


A mim, quase todos chamam de Flávia mesmo. Apenas meus pais e irmãos me chamam de Flavinha, alguns amigos também... mas a maioria das pessoas me chama de Flávia e eu gosto. Acho o som mais parecido comigo do que o do diminutivo. Eu me acho muito intensa para ser chamada por um diminutivo, mas não me importo que usem, sei que é por carinho.

A propósito, não sei se percebeu, mas me encantam páginas em branco.

Abril de 2009

Trecho de e-mail enviado a um amigo, que acha um tanto ridículo ser chamado pelo apelido.
O texto também é um dos prólogos de um grupo de contos chamados "Meia vida em Quatro Atos" .


Estou enamorada Elisa Lucinda. A Clarice está até enciumada.
Explico. Sou uma apaixonada pela palavra, mas de uma paixão infiel, voraz, curiosa, indo de autor em autor, "inconstante e borboleta". Nesses anos todos, apenas a Clarice teve alguma constância da minha atenção.

É engraçado isso. Eu gosto de ler, leio de tudo. Encanta-me toda palavra. A palavra é algo mágico, sedutor, mais que descrever, a palavra representa, mostra, define. E o faz com força, de forma explicita, sem meios termos, sem entrelinhas. Não consegui, até hoje, encontrar nada mais corajoso e absoluto do que a força da palavra. Se, no começo, era o verbo... é confortador saber que, no final, há o silêncio. Confortável, sereno, encantado, triste, melancólico, feliz, cansado, surpreso. Não importa. O silêncio, quando segue a palavra, é como um abraço depois do gozo.

Mesmo nos áridos anos em que não pude ler livros ou poemas, sempre me presenteei um momento com uma palavra. Fosse um artigo, um outdoor, um pensamento, uma frase de pára-choque de caminhão... sempre parei para olhar com calma, absorver a essência, com o mesmo vagar que se tem quando se quebra uma dieta, saboreando um doce devagarinho já que não se pode fazê-lo sempre.

E, nesta tarde de domingo, me encontrei em muitos versos da Elisa Lucinda. Senti com ela os mesmos sentimentos que me trazem os versos da Clarice. A admiração pela beleza da construção dos versos não é nada, ainda que, sem dúvida, belos, os versos. O que surpreende e fascina é esse sentimento desconcertante de olhar no espelho...

(maio de 2009, depois de ler O poema do Semelhante)
http://www.escolalucinda.com.br/bau/osemelhante.htm
Te amo agora!
Levou 20 anos para perceber. Se soubesse, tinha dito mais vezes...
Ao primeiro namorado disse “eu também” com tanta doçura que nenhum dos dois percebeu o disfarce.
O segundo beijou-a tão depressa, depois de proferir a sentença, que nenhum dos dois sentiu falta da resposta.
O terceiro nunca disse, embora os olhos trouxessem o sentimento escancarado e exposto. Ela retribuiu na mesma linguagem. E, para os dois, isso foi bom.
Com o derradeiro, soube desde o primeiro dia. Ouviu no segundo mês e declarou um pouco depois. Negou várias vezes, depois que a deixou. Por fim, aceitou e guardou o amor, finda a paixão.
Ao próximo, deixará o sentimento explodir em palavra, assim que transbordar do peito!
Levou 20 anos, mas percebeu. “Te amo” quer dizer “te amo agora”!

Junho de 2009
Palavras pinçadas no ar depois de um almoço com uma amiga

Acordou e abriu um olho só. O outro deixou enfiado no travesseiro. Viu que as palavras não encheram o pensamento e ficou ali, olhando a parede e ouvindo o silêncio. Ouviu o ruído do edredom roçando no corpo devagar quando abraçou o travesseiro. Ouviu o suspiro profundo que a preguiça soltou. Ouviu o barulho do mundo entrando devagarinho no quarto. Deixou-se ficar ali, até o outro olho insistir para abrir, até as palavras começarem a rodear, namoradeiras, em volta dela... “acordou e abriu um olho só...”

Junho de 2009, manhã preguiçosa de domingo