Arquivo do blog

domingo, 26 de agosto de 2012


Taças Preparadas

Já era tarde
embora não tarde demais
quando emparelharam-se
em alto mar
sedentos.

Havia no ar um encanto
de manhãs que se sabem festivas.

Daquelas em que se abrem
portas e janelas,
mudam-se móveis de lugar,
escolhem-se louças e taças,
enfeitam-se os cômodos de flores e velas.

Havia no ar uma espera,
daquelas que se sabem saborosas.

Como um cheiro de bolo no forno.
Como um aroma de livro em livraria.
Como um perfume que antecipa o beijo.

Havia nos olhos um brilho de início
nos lábios um sorriso de hoje
nas mãos um calor de sempre
nos beijos uma certeza de abraço
nos braços uma ânsia de toque
nos toques uma urgência.
E um carinho.

Já era tarde
mas não tarde demais.

E não havia mais muros.


Flávia Côrtes - Agosto de 2012
www.poetaflaviacortes.com.br
Textos devidamente registrados na Biblioteca Nacional e protegidos quanto aos seus direitos autorais.
======================================================
Poesia Falada: Confira tudo sobre o CD no link Verso em Voz
Maiores informações: contato@poetaflaviacortes.com.br
======================================================


sexta-feira, 24 de agosto de 2012



Rotas

Como barcos que se cruzam
em oceanos,
estação sim,
estação não,
nos avistamos.

Da primeira vez que nos encontramos,
içou velas e partiu
rumo ao meu peito.

Daquela vez,
fui eu quem precisou partir
antes que você chegasse.

Da segunda vez que nos encontramos, 
já senhora de meus caminhos,
esperei que conduzisse o rumo.

Daquela vez,
foi você quem precisou partir
antes que eu chegasse.

E quando menos espero
avisto a nós dois de novo
como veleiros que se cruzam
em oceano.

E espero.

(Flávia Côrtes - Agosto de 2012)
www.poetaflaviacortes.com.br
Textos devidamente registrados na Biblioteca Nacional e protegidos quanto aos seus direitos autorais.
======================================================
Poesia Falada: Confira tudo sobre o CD no link Verso em Voz
Maiores informações: contato@poetaflaviacortes.com.br
======================================================

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Sobre portas, sorrisos e abraços.

Era a primeira vez que abria ela mesma aquela porta.

"A casa exalava infâncias".
O pensamento trouxe um sorriso assim que ela virou a chave.

Era uma porta antiga de ferro trabalhado pintado de branco. O desenho imitava flores vazadas, muito parecidas com as que a avó tricotava em paninhos de mesa. As flores davam à porta uma aparência delicada.

Sempre achou apropriado que a porta da casa, que um dia foi da avó, tivesse flores tricotadas em ferro branco.

Por trás da porta tricotada, via-se uma outra porta de vidro fosco que fechava-se sobre a primeira. Nos dias de calor, o vidro era mantido aberto e isso garantia à casa frescor. Tanto pela corrente de vento que se formava, como pelas risadas das crianças brincando lá fora.

Quando menina, achava engraçado que a casa tivesse duas portas que viravam uma quando fechadas.
Achava bonito que o ferro precisasse do vidro para fechar realmente a casa e não apenas enfeitá-la.
E gostava de ver uma porta de ferro com vocação para enfeite. E uma porta de vidro com vocação para tranca.

Desde sempre, houve sorrisos na chegada.
E os sorrisos àquela porta, sempre foram prenúncios de abraços.

A avó a esperava com a porta aberta.
Perdeu a conta de quantas vezes correu para aquele sorriso.

O pai nunca a esperou à porta. Aguardava-a  na calçada.
O sorriso dele iluminava o caminho desde a esquina, esperando que ela se aninhasse em seu ombro tagarelando os dias.

A mãe sempre a esperava do lado de dentro com as duas portas fechadas.
Dava para ver o sorriso dela, por trás do vidro fosco, antes mesmo que a porta se abrisse para o abraço das duas.

Era a primeira vez que abria ela mesma a porta de ferro branco.
Os incontáveis sorrisos àquela porta encheram o pensamento e transbordaram mais um.

Os sorrisos naquela casa sempre foram prenúncios de abraços.
Então, ela não estranhou quando a casa a abraçou.

E a casa
exalava infâncias.

Agosto de 2012

segunda-feira, 13 de agosto de 2012



Antes das Nove


Antes do dia,

antes da rotina,
sonhos.


Antes que percebas,

antes que eu saiba,
quereres.

Antes que esperes,

antes que eu evite,
desejos.

Como o olhar antes do toque,

como a intenção antes do beijo,
o dia começa antes do dia.


(Flávia Côrtes - Novembro de 2011)

Textos devidamente registrados na Biblioteca Nacional e protegidos quanto aos seus direitos autorais.
======================================================
Poesia Falada: Confira tudo sobre o CD no link Verso em Voz
Maiores informações: contato@poetaflaviacortes.com.br
======================================================



Amputação

Um dia
e eu recolho as suas roupas.

No máximo uma semana
e eu deleto as suas fotos.

Talvez um mês
e eu volto ao centro da cama.

Dizem
que quando se amputa um pedaço,
a gente ainda leva um tempo
sentindo o que foi extirpado.

Deve ser por isso
que eu ainda te percebo
e te sinto.

Quanto tempo será
para extirpar você
de mim?


(Flávia Côrtes - Maio de 2011)

Textos devidamente registrados na Biblioteca Nacional e protegidos quanto aos seus direitos autorais.
======================================================
Poesia Falada: Confira tudo sobre o CD no link Verso em Voz
Maiores informações: contato@poetaflaviacortes.com.br
======================================================