Arquivo do blog

domingo, 30 de setembro de 2018

O Amor em Tempos de Cólera

Pouco impressiona ou surpreende
a quem conhece a humanidade
tantas atitudes
desassociadas do verbo.

Houve uma época
em que diretrizes políticas
eram temas de debates.

Os tempos mudaram.
Ou mudamos nós.
(... quem haverá de saber?)

O fato é que vivemos
um tempo intolerante
nesta quase previsível
involução Humana.

Intelectuais e pensadores
auto-denominados democráticos
selecionam suas amizades
utilizando por conceito
homogenia filosófica.

Pacifistas escolhem,
deliberadamente,
a ofensa ao outro
em detrimento do argumento.

Diálogos natimortos
iniciados com xingamentos
excluem qualquer evolução,
seja ela de pensamento
ou relação.

Opiniões metralhadas
em rajadas exaltadas de ódio
elevam (se muito) sobrancelhas.

Nesse moderno tempo digital,
em que palavras de ordem
ecoam como dogmas,
excluem-se mais
que pseudo-amizades
por pré-conceito filosófico.

Excluídos estão também,
nestes casos,
o respeito
e a educação.

E assim isolam-se,
em homogêneos guetos de opinião,
ditadores da própria retórica
(com bandeiras as mais diversas).

Pseudo-democratas cheios de ódio
por qualquer caminho ou solução
que difira dos próprios,
ilhados entre iguais.
(... ao que podemos quase agradecer.)

Em meio a tanto ódio e prepotência
surpreende, na verdade,
a descoberta inédita
de tanta gente disposta
a respeitar diferenças.

Regozijemo-nos, portanto,
por aqueles que conseguem
expressar-se com clareza e foco,
ainda que a opinião do outro o irrite.

Alegremo-nos em perceber
serenidade, ternura e lucidez,
mesmo diante de surpresa e aversão
ao pensamento diverso.

Para uma Humanidade melhor,
seres humanos abertos
à coexistência pacífica
com diferenças.

Nem tudo que se vê é espelho.
Estilhaços não vão mudar isso.

Flávia Côrtes - setembro de 2018

quarta-feira, 19 de setembro de 2018

Girassol

Tem um tempo
em que a saudade
já quase não dói.

Quase.

E quem teve a graça
de conhecer
vira-se para a lembrança
qual flor mirando o sol.

Flávia Côrtes
(Neste dia 19, para a Dona do Sorriso. Entendedores entenderão...)

sábado, 25 de agosto de 2018


Hemisférios

Dizem que o Ser,
humano é
por pensamento.

Desfaço-me de humildade
(se é que a tenho)
e discordo.

O que o trouxe até aqui,
não foi seu humano raciocínio.

Este, se maior ou menor,
o levaria, senão aqui,
talvez logo ali.

O que faz quem você é
não é seu nome ou endereço,
não é sua idade ou ofício.

Quantos diplomas em sua parede,
quantas medalhas em seu peito,
as roupas que você veste,
os livros que você lê,
os lugares por onde foi...

será que te contam?
será que te mostram?

Só pistas.
Indícios.

Suas conquistas.
Vitórias ou casualidades?

Suas escolhas.
Decisões ou circunstâncias?

Nascesse em outra família,
estudasse em outra escola,
frequentasse outro clube,
morasse em outro prédio?

Acredita, realmente,
Ser Humano,

que o traria
exatamente a este ponto
o seu intelecto?

que o definiriam
ainda
os mesmos vernizes?

O que o fez Humano,
então,
Ser Humano?

Raciocínio?
Pensa mesmo?

Ou será que repousa
a resposta
da sua identidade

na tênue linha  
entre o sonho e a fantasia?

na sutileza que separa
o plano da invenção?

naquilo que o emociona,
naqueles por quem respira?

Pense aí,
antes de responder.

Ou sinta.

(Flávia  Côrtes - agosto de 2018)









sábado, 23 de junho de 2018

Positivo e Negativo

Acostumada que era
à luz, à ternura e à alegria,
aprendeu muito cedo
a força do SIM.

Positiva sempre,
abriu  espaços onde não havia,
construiu sobre abismos,
aterrou em inundações,
preencheu silêncios.

Iluminou vazios
até que, aos seus olhos,
só houvesse luz.

Levou alguns muitos anos
para perceber
a exaustão pacificadora
do SIM.

Precisou aprender.

Nem todo vazio pede completude.
Nem todo abismo necessita ponte.
Nem todo mar escolhe a areia.
Nem todo silêncio demanda palavra.

E não é a luz, certamente,
que desagrada da sombra.

É verdade.
O SIM pode ser pacificador.

Mas, algumas vezes,
só o NÃO liberta.

(Flávia Côrtes - junho de 2018)

quarta-feira, 25 de abril de 2018

Reflexões Verdes

Sempre achou bonitas
as árvores que ladeavam a rua
e a deixavam menos cinza
todos os dias.

Não só à rua na verdade.
Também a ela.

Todo dia as via.
E aquilo fazia bem.

Levou anos
para perceber
nem todas inteiras.

Aquelas que ali estavam,
antes dos fios,
erguiam-se gigantescas rumo ao céu
como cabe a uma árvore.

A fiação passando
indolor
abaixo.

Aquelas, porém, que
possivelmente chegaram depois
tiveram os galhos laterais
pouco a pouco amputados
antes da fiação.

Isso não impedia,
porém,
a majestade.

Nem por isso menos belas,
nem por isso menos altivas,
nem por isso menos árvores,
erguiam-se
(ainda que metade)
gigantescas rumo ao céu.

Como cabe a uma árvore.

A fiação passando,
ao lado,
logo abaixo.

Indolor.

Pelo menos a nós
que não somos árvore.

Flávia Côrtes
Abril de 2018









segunda-feira, 9 de abril de 2018

Trincheiras

Em tempos sombrios,
alistaram-se
em suas próprias
batalhas.

Isolados
em meio ao
fogo cruzado,
resolutos e firmes,
mantiveram-se
certeiros.

Por sobrevivência,
superaram medos,
abandonaram hábitos,
ignoraram limites.

Na mira,
inabalável,
o alvo.

E, ainda assim,
remota era
a vitória.

Até que um dia,
a força da aliança
superou aquilo
que se teimava
só.

Foi quando
a guerra de um
virou batalha do outro.

Já não importava
o breu da noite mais densa,
o frio do inverno mais árido,
o calor da batalha mais árdua.

Havia paz.


Abril de 2018
Flávia Côrtes 
(Para Everson, que me acompanha,
na alegria e na tristeza, em todos os dias
da minha vida.)

domingo, 25 de fevereiro de 2018

Lição de Casa

Só ao caminho,
basta o caminhar.

Nós que somos
viajantes nesta estrada
aprendemos cedo ou tarde
que o SIM simplifica
mas NÃO
resolve.

Silêncio bom
só existe
em Harmonia.

E o respeito vira a esquina
pouco antes da gente
virar a página.

Exercita o diálogo.

Assim, nem Todo Dia
ameaça o Para Sempre
daqueles que se sabem
desde Sempre.


(Flávia Côrtes - fevereiro de 2018)